Quando a internação acontece: um momento de dúvida e fragilidade
Quando um ente querido precisa ser internado, seja por tratamento de dependência química, transtornos mentais ou outras condições graves, é comum que a família se sinta perdida, insegura e até mesmo culpada. Mas há um aspecto fundamental que muitas vezes é negligenciado: os direitos do paciente internado.
Será que ele pode receber visitas? Pode se recusar a continuar o tratamento? Tem direito a contato com a família ou acompanhamento jurídico? Essas e tantas outras perguntas pairam na mente dos familiares – e, claro, também dos próprios pacientes, que muitas vezes passam por esse processo fragilizados, com medo e sem saber exatamente o que esperar.
Vivemos em um país com leis específicas que visam garantir dignidade e respeito à pessoa internada, independentemente do motivo que a levou até ali. No entanto, a falta de informação ainda é um dos maiores obstáculos para que esses direitos sejam realmente respeitados e compreendidos.
O que a legislação brasileira assegura a quem está em tratamento
O Brasil conta com uma série de dispositivos legais que garantem os direitos do paciente internado, seja em instituições públicas ou privadas. Entre os principais marcos, está a Lei nº 10.216/2001, também chamada de Lei da Reforma Psiquiátrica, que protege a integridade e os direitos das pessoas com transtornos mentais.
Essa lei estabelece que todo paciente deve ser tratado com respeito, sem discriminação e de forma individualizada. É direito dele receber informações claras sobre seu diagnóstico, entender quais são as alternativas terapêuticas disponíveis e até mesmo optar por não seguir determinada abordagem, sempre que possível. Nos casos de internação involuntária, no entanto, há exigências legais específicas que devem ser cumpridas.
Outro avanço importante é o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que reforça a autonomia e dignidade dessas pessoas, mesmo em ambientes de internação. Isso significa que o paciente deve estar protegido contra qualquer tipo de abuso, ter acesso a um atendimento humanizado e manter, sempre que possível, o contato com a família.
Já a Resolução nº 2.056/2013 do Conselho Federal de Medicina regulamenta aspectos éticos da internação psiquiátrica, como a obrigatoriedade de notificar o Ministério Público em internações involuntárias, com laudos e prazos claros.
Vale lembrar que, mesmo internado, o paciente continua tendo direito a visitas de familiares e de advogados. A restrição a esse contato só é justificada em casos extremos, com respaldo médico. Isso tudo contribui para uma clínica de reabilitação mais ética, respeitosa e eficaz.
Na prática: entre avanços e dificuldades enfrentadas por famílias
Na realidade do dia a dia, nem sempre os direitos do paciente são respeitados como deveriam. Muitos familiares só descobrem a existência dessas garantias quando algo dá errado: quando a visita é negada sem justificativa, quando não recebem informações sobre o estado clínico do paciente ou quando percebem comportamentos estranhos que indicam maus-tratos.
Casos de internações involuntárias mal conduzidas são comuns. Apesar da legislação exigir um laudo médico e comunicação ao Ministério Público, há clínicas que não seguem esses protocolos. O resultado? Um paciente isolado, confuso e vulnerável dentro de um sistema que deveria acolhê-lo.
Outro ponto crítico é a falta de transparência. Não é raro encontrar pessoas que relatam não terem sido informadas sobre o motivo da internação ou sobre o plano terapêutico. Isso não apenas viola a lei, como prejudica diretamente o processo de recuperação.
Mas nem tudo são dificuldades. Há instituições que são exemplos de boas práticas: promovem reuniões com os familiares, oferecem atualizações periódicas, respeitam os limites do paciente e investem em projetos terapêuticos que o reintegram à sociedade.
Imagine um jovem em tratamento que participa de rodas de conversa, tem acompanhamento psicológico semanal, mantém contato com a família e é incentivado a refletir sobre seu próprio processo. Nesse cenário, a chance de sucesso aumenta significativamente — e isso só é possível quando os direitos do paciente são colocados no centro do cuidado.
Informação como ferramenta de proteção e mudança
Falar sobre os direitos do paciente internado é, acima de tudo, defender o cuidado com dignidade. A internação não deve ser um castigo, mas uma oportunidade real de recuperação. Infelizmente, muitas instituições ainda operam de forma desumanizada, tratando pessoas como números, apagando suas vozes e suas histórias.
Por isso, familiares devem agir com cautela. Investigar a reputação da clínica, visitar o local antes da internação, conversar com os profissionais e exigir transparência são atitudes fundamentais. O respeito ao paciente não é um favor — é um dever legal e ético.
Além disso, lembrar que o paciente internado continua sendo um cidadão com direitos civis é essencial. Ele pode e deve ser ouvido, participar das decisões sobre sua saúde e manter laços afetivos e sociais sempre que for viável.
Se quisermos um futuro mais justo e humano para quem enfrenta transtornos mentais ou a dependência de substâncias, precisamos de mais informação, mais fiscalização e, acima de tudo, mais empatia. O papel da sociedade, dos familiares e dos profissionais é lutar para que o tratamento deixe de ser sinônimo de dor e se torne um verdadeiro recomeço.
Se você está vivendo essa realidade com alguém próximo, saiba: buscar informação é o primeiro passo. E, felizmente, você não precisa fazer isso sozinho.